quinta-feira, 27 de março de 2014

CONTRA FATOS NÃO HÁ ARGUMENTO

"Então o sumo sacerdote perguntou a Estêvão: São verdadeiras estas acusações?...
...Povo rebelde, obstinado de coração e de ouvidos! Vocês são iguais aos seus antepassados: sempre resistem ao Espírito Santo!...
...Mas eles taparam os ouvidos e, gritando bem alto, lançaram-se todos juntos contra ele, arrastaram-no para fora da cidade e começaram a apedrejá-lo. As testemunhas deixaram seus mantos aos pés de um jovem chamado Saulo..." Atos dos Apóstolos 7

Estevão havia sido acusado de falar contra o templo e contra a lei, ou contra Moisés e contra Deus. Eles não estavam muito certos porque afinal as testemunhas eram falsas e se contradiziam um pouco.
E ele começa sua defesa no capítulo 7 e termina o capítulo sendo apedrejado e morto.
Em sua defesa ele mostra que a história do judaísmo não havia sido um mar de rosas como muitos pensavam. Abrão fazia parte de um povo pagão e politeísta, mas mesmo assim é neste lugar pouco "santo" que Deus o chama. Os filhos de Jacó, bisnetos do grande Abraão, tiveram inveja do irmão José e o venderam como escravo ao Egito. Sim, os 11 patriarcas dos quais todos os judeus descendiam foram escravagistas do próprio irmão.
Mas mesmo lá no Egito, outra terra pagã, Deus cuida de José e usa esta mesma nação pagã para salvar a vida da pequena família hebreia, que passava fome.
O extraordinário Moisés, representante da lei que os judeus veneravam, comete um assassinato e por isso precisa fugir.
Mas mesmo assim, Deus o escolhe para livrar seu povo da escravidão, e o mesmo hebreu que o acusara de assassinato, que questionara sua liderança, agora precisa admitir seu erro e seu mal julgamento.
No deserto, o povo hebreu julga mal de novo e pede para o grande Arão, sumo sacerdote, encarregado de interceder a Deus pelo povo, fazer um bezerro de ouro para que pudessem adorar; o povo ainda carregava a idolatria em seu coração.
Davi, homem segundo o coração de Deus em sua sinceridade, é impedido de construir o templo porque tinha as mãos carregadas de sangue, mas seu filho o constrói, mesmo sabendo que esta não era a vontade de Deus.
Erro em cima de erro, maus julgamentos, idolatria, rebeldia. Estevão termina dizendo que os seus acusadores estão tão equivocados como estiveram muitas vezes as pessoas mais célebres do judaísmo.
É difícil ouvir verdades incontestáveis. Precisa-se ter muita humildade para aceitar o fato de que cometemos muitos erros no passado. Há que se ter coragem para ouvir, aceitar e dar meia volta e tentar arrumar as coisas. Isso geralmente leva gerações para acontecer.
Os religiosos não aceitaram ouvir seus tropeços e calaram a boca de Estevão.
Hoje não é diferente. Aqueles que se atrevem a falar contra o sistema religioso imposto são tidos como hereges e rebeldes, e logo têm sua voz calada pelo poder.
Na maioria das vezes não matam fisicamente, mas matam moralmente e de forma caluniosa. Abafam a voz daqueles que tentam mostrar por "a" mais "b" que tem alguma coisa muito errada acontecendo dentro deste universo chamado "igreja" institucionalizada.
Ontem, comentando a respeito, dissemos: será que teríamos coragem de fazer o que Estevão fez? Será que correríamos o risco de termos nossa reputação assassinada pelo sistema?
E a resposta foi: Sim, se estivermos cheios do Espírito Santo, porque é Ele quem nos encoraja a falarmos a verdade.
Enche-nos ó Deus do teu Espírito, esta é a minha oração.

sexta-feira, 14 de março de 2014

CONVIVENDO COM O DIFERENTE

"Naqueles dias, crescendo o número de discípulos, os judeus de fala grega entre eles queixaram-se dos judeus de fala hebraica, porque suas viúvas estavam sendo esquecidas na distribuição diária de alimento. Por isso os Doze reuniram todos os discípulos e disseram: "Não é certo negligenciarmos o ministério da palavra de Deus, a fim de servir às mesas. Irmãos, escolham entre vocês sete homens de bom testemunho, cheios do Espírito e de sabedoria. Passaremos a eles essa tarefa e nos dedicaremos à oração e ao ministério da palavra". Tal proposta agradou a todos. Então escolheram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, além de Filipe, Prócoro, Nicanor, Timom, Pármenas e Nicolau, um convertido ao judaísmo, proveniente de Antioquia. Apresentaram esses homens aos apóstolos, os quais oraram e lhes impuseram as mãos." Atos 6:1-6

Lá vou eu com meu coração peludo novamente tentar entender o texto.
Mas me respondam: Por que somente as viúvas dos judeus de fala grega estavam sendo esquecidas na distribuição do pão? Por que os apóstolos pedem para que eles mesmos resolvam o problema (escolham entre vocês)? Por que as pessoas escolhidas foram somente homens com nomes gregos?
A minha resposta é simples. Tratamento diferenciado já nos primeiros dias da igreja.
Um pouco de história para atualizar. Os judeus helenistas, ou seja, os de fala e costumes gregos haviam deixado a palestina por inúmeras razões, desde as vezes em que Israel fora levado como escravo por outras nações, até por questões comerciais e políticas. O fato é que, ao conviver com outros povos, acabou absorvendo seus costumes de alguma forma, e se tornando mais "abertos" ao sopro do mundo, diferentes dos seus irmãos que permaneceram na Palestina. Isto obviamente gerou desde sempre, uma certa rivalidade entre os dois grupos, que ao meu ver está evidente no texto em questão.
Já vi muito teólogo influente tentando salvar a pele dos judeus de fala hebraica (ou aramaica), onde estavam incluídos os doze apóstolos, querendo dizer que este problema não foi proposital. Não vejo razão para isso, porque acho que Lucas quis exatamente contar a história do jeito que ela foi, sem diminuir nem pôr, mas sendo o mais honesto possível com os acontecimentos, mesmo os mais desagradáveis.
Não há muito o que especular no texto. À medida que os grupos vão crescendo, vão aparecendo os problemas de relacionamento e consequentemente vamos expondo nossas fragilidades e nossos preconceitos. É fácil conviver com aqueles que são iguais, que pensam igual e sempre concordam conosco. Mas neste caso não há crescimento de nenhum dos lados.
É difícil conviver com pessoas que pensam diferente, que falam outra língua ou que têm coragem de nos interpelar porque não concordam com nossa posição. Neste caso, se houver discussão madura, haverá crescimento de ambos os lados do embate.
O evangelho de Jesus veio exatamente unir os diferentes. Colocar na mesma mesa da comunhão pessoas que pensam e reagem de forma diferente, e mostrar que aquilo que nos une é maior que aquilo que nos divide. O evangelho de Jesus veio provar que é possível conviver com conflitos de opinião, mas sempre tendo como ponto de elo o amor a Deus e o respeito ao outro.
Por isso, ao estudar este texto fiz-me uma pergunta: Como Jesus resolveria o conflito do problema da distribuição dos pães?
Veio-me à mente Jesus, calmamente se levantando, pegando a bandeja de comida nas mãos e servindo a todos sem distinção. Depois Jesus olha para as pessoas e pergunta: Vocês conseguem fazer isso? Se sim, então nós não temos mais um problema.